Se existe um bioma que representa a força produtiva do Brasil e, ao mesmo tempo, o desafio da preservação ambiental, esse bioma é o Cerrado brasileiro. Conhecido como o “berço das águas”, o Cerrado cobre cerca de 25% do território nacional e abriga uma biodiversidade impressionante, com mais de 12 mil espécies de plantas e centenas de animais únicos no planeta, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Mas foi também sobre esse solo que o agronegócio brasileiro consolidou sua potência. Soja, milho, algodão, carne, boa parte da produção agropecuária vem exatamente das áreas do Cerrado. E é justamente aí que mora a dúvida de muitos: é possível conciliar conservação e produtividade?
A resposta é sim, e o Cerrado já está provando isso. Com práticas agrícolas sustentáveis, tecnologia de ponta e gestão ambiental responsável, fazendas e produtores estão mostrando ao mundo como a agricultura regenerativa e a preservação ambiental no agronegócio podem andar de mãos dadas.
A seguir, vamos entender por que o Cerrado virou um exemplo global de produção com conservação!
O que torna o Cerrado tão importante para o mundo
O Cerrado brasileiro é considerado o segundo maior bioma da América do Sul e uma das savanas tropicais mais biodiversas do mundo. Ele abriga cerca de 5% de toda a biodiversidade do planeta e é fundamental para o equilíbrio climático da América Latina.
Mas o Cerrado não é importante apenas pela fauna e flora. Ele também é estratégico para o abastecimento de água: sete das doze grandes bacias hidrográficas brasileiras nascem ali, como as dos rios São Francisco, Tocantins-Araguaia e Paraná.
Além disso, o bioma é peça-chave no tabuleiro da segurança alimentar global. Mais de 60% da produção de grãos do Brasil vem dessa região, tornando-o essencial para o comércio agrícola internacional.
Ou seja, proteger o Cerrado é proteger o que nos alimenta, e isso vale tanto para o Brasil quanto para o mundo.
Desafios históricos entre agricultura e meio ambiente no Cerrado
A história do desenvolvimento agrícola no Cerrado começou nos anos 1970, com o avanço da fronteira agrícola incentivado por políticas públicas e pesquisas da Embrapa. Na época, o solo ácido e pouco fértil foi “domado” com técnicas de correção e adubação, transformando a região em uma potência produtiva.
Mas esse avanço veio acompanhado de pressão sobre os ecossistemas naturais. Estima-se que cerca de 50% da vegetação original do Cerrado já foi desmatada, de acordo com dados do MapBiomas. A conversão de áreas nativas para pastagens e monoculturas causou perda de biodiversidade, erosão, contaminação de nascentes e emissão de gases de efeito estufa.
Durante décadas, a relação entre agricultura e meio ambiente no Cerrado foi vista como um conflito. Porém, nos últimos anos, essa mentalidade começou a mudar. Tecnologia, políticas de conservação e novas exigências de mercado estimularam uma transição para modelos mais sustentáveis.
Exemplos de práticas agrícolas sustentáveis no Cerrado
Hoje, a produção agrícola sustentável no Cerrado é uma realidade em expansão. Diversas práticas estão sendo adotadas por produtores que desejam manter a produtividade sem abrir mão da conservação ambiental:
1. Integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF)
Essa prática combina o cultivo de grãos, a criação de gado e a manutenção de áreas florestais no mesmo espaço, em rotação ou consórcio. Ela melhora a saúde do solo, reduz o uso de insumos e aumenta a rentabilidade por hectare.
2. Agricultura de Baixo Carbono (ABC)
O Plano ABC, criado pelo governo brasileiro, incentiva práticas como plantio direto, fixação biológica de nitrogênio e recuperação de pastagens degradadas, ações que ajudam a mitigar as mudanças climáticas.
3. Sistemas agroflorestais
Sistemas agroflorestais misturam culturas agrícolas com espécies arbóreas, promovendo biodiversidade, sombreamento e melhoria da fertilidade do solo. São ideais para pequenas propriedades e já vêm sendo replicados em áreas do Cerrado.
4. Conservação de nascentes e corredores ecológicos
Propriedades têm adotado faixas de vegetação nativa entre áreas produtivas, conectando fragmentos de Cerrado e protegendo nascentes e cursos d’água.
Casos de sucesso: fazendas modelo no Cerrado
Algumas fazendas brasileiras se tornaram referências globais em conservação e produtividade. Veja dois exemplos que mostram como é possível produzir com respeito ao meio ambiente:
Fazenda Santa Brígida (GO)
Localizada em Ipameri (GO), a fazenda Santa Brígida é um modelo de ILPF. Com cerca de 500 hectares, a fazenda aumentou em mais de 30% a produtividade de grãos e carne, enquanto regenerou áreas degradadas e reduziu emissões de carbono. Ela já foi visitada por comitivas de países como Alemanha, França e China.
Grupo Roncador (MT)
No leste do Mato Grosso, o Grupo Roncador desenvolveu um sistema de agricultura regenerativa em larga escala. Eles recuperaram áreas degradadas com rotação de culturas, pastagem com manejo rotacionado e recomposição de áreas de preservação permanente (APPs). Com isso, aumentaram a produção e se tornaram referência para preservação ambiental no agronegócio.
Esses casos mostram que, com planejamento e tecnologia, a conservação do Cerrado e o crescimento do agro podem caminhar juntos.
Como o Cerrado está influenciando políticas e práticas globais
O sucesso das iniciativas sustentáveis no Cerrado começa a influenciar políticas públicas e estratégias globais de agricultura e conservação.
- A COP28, realizada em 2023, destacou exemplos brasileiros de integração entre produção e preservação, especialmente os do Cerrado, como modelos para países em desenvolvimento.
- O programa Race to Zero, da Organização das Nações Unidas (ONU), incluiu propriedades do Cerrado que demonstraram reduções mensuráveis nas emissões de carbono com práticas regenerativas.
- Além disso, acordos comerciais internacionais já incluem cláusulas de sustentabilidade que exigem comprovação de boas práticas ambientais nas áreas de produção.
Tudo isso fortalece a imagem do Cerrado brasileiro como um modelo de agricultura sustentável e posiciona o Brasil como protagonista da transformação ecológica no campo.
Logo, a história do Cerrado brasileiro é, ao mesmo tempo, um alerta e uma inspiração. Por muito tempo, ele foi vítima de uma visão de curto prazo que via o solo apenas como recurso a ser explorado. Mas hoje, graças à ciência, à inovação e ao engajamento de produtores conscientes, o Cerrado começa a escrever uma nova narrativa: a de um território que produz e preserva.
Ao adotar práticas sustentáveis, investir em conservação ambiental e mostrar que a produtividade não precisa ser inimiga da natureza, o Cerrado está influenciando não só o Brasil, mas o mundo inteiro.
Se quisermos garantir o futuro do agro e da biodiversidade, o equilíbrio entre agricultura e meio ambiente precisa deixar de ser exceção e se tornar regra. E nesse caminho, o Cerrado está mostrando que é possível, e viável, colher bons frutos cuidando da raiz.
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