Exclusiva

Fila de caminhões, rodovias esburacadas e estradas provisórias: os desafios para escoar a safra 2024/25 de soja

Principais impactados pelas adversidades logísticas são os produtores, que perdem rentabilidade; competitividade da soja segue alta no mercado internacional

Fila de caminhões, rodovias esburacadas e estradas provisórias: os desafios para escoar a safra 2024/25 de soja

Na semana passada, para um caminhão descarregar soja no porto de Porto Velho, em Rondônia, ele teria que enfrentar, parado, de quatro a seis dias, uma fila de 1.200 veículos, até que conseguisse finalizar seu trabalho.

Além de impactar as pessoas nas redes sociais, as imagens do local chegaram aos principais veículos de imprensa e levantaram novos questionamentos sobre a eficiência logística brasileira perante uma produção agrícola que não para de expandir.  

Esse cenário, explica Edeon Vaz Ferreira, Diretor Executivo do Movimento Pró-Logística de Mato Grosso, foi causado pela falta de escalonamento no plantio da soja no final do ano passado, o que, consequentemente, concentrou boa parte da colheita em fevereiro e março.

De acordo com dados da consultoria DATAGRO Grãos, a colheita da safra 2024/25 de soja, a nível nacional, se iniciou em 10 de janeiro, com apenas 8,5% das áreas colhidas naquele mês, ritmo abaixo da média dos últimos cinco anos. Em fevereiro, no entanto, houve um avanço expressivo de 42,5 pontos percentuais, encerrando o mês com 51% da área colhida e superando os índices da safra 2023/24 e a média plurianual.

Agora, neste final de março, os trabalhos de colheita se aproximam de 80% da área projetada, com os principais estados produtores do Centro-Oeste já tendo, virtualmente, finalizado as atividades.

“Como atrasaram as chuvas no ano passado, houve uma concentração no plantio. Com essa concentração no plantio, concentrou a colheita, é automático. E com essa concentração da colheita, o fluxo de caminhões para os portos foi muito mais intenso”, explica Ferreira. 

A média das tarifas de frete para o transporte de grãos nas rotas monitoradas pela DATAGRO foi de R$ 228,13/t na semana encerrada em 21 de março, volume 19,2% acima do registrado no mesmo período de 2024.

Segundo o Diretor Executivo do Movimento Pró-Logística, o problema observado em Porto Velho (RO) foi agravado pelo fato do local não possuir armazéns e secadores. Entretanto, o caso de Rondônia não foi exclusivo – filas de caminhões também foram observadas no terminal portuário de Miritituba, no Pará, mas por outro motivo: a precariedade de acesso às estações de transbordo no Rio Tapajós são provisórias e possuem duas elevações complicadas para passar.

“E quando chove não passa. Então aí precisa ter uma máquina para tracionar os caminhões, uma operação demorada, o que forma aquelas filas que a gente também viu lá”, completa Edeon.

A safra 2024/25 registra ainda, até o momento, dois contratempos grandes, que impactaram o escoamento da produção. Um deles foi o rompimento de uma estrutura no porto de Barcarena (PA); o outro, a queda de uma passarela na rodovia dos Imigrantes, que dá acesso ao porto de Santos. “São coisas que acontecem, cada safra é uma safra, tem sua própria história”, diz Ferreira.

Sobre a situação da BR-163, que corta o estado do Mato Grosso no sentido Norte-Sul, passando por Rondonópolis, onde há terminal ferroviário, até os portos do Pará, Edeon chama atenção para uma série de buracos, causados pelas chuvas que afetam a região e elevado tráfego de caminhões. “A situação não está 100%, mas também não é, hoje, um impeditivo para o escoamento da safra”, ressalta.

Produtores: os maiores prejudicados

Os diversos problemas de escoamento enfrentados pelo Brasil não tiram a competitividade da soja brasileira no mercado internacional, mas afetam, sobretudo, a rentabilidade do produtor.

“A soja brasileira leva uma vantagem sobre a de outros países, porque ela tem maior teor de proteína do que a norte-americana e a argentina, por exemplo. Então, nós somos muito competitivos, a gente compete com os outros países em função de volume e qualidade”, explica Edeon.

O problema que acontece no Brasil é um problema de rentabilidade do produtor, ou seja, o que acontece entre a origem e o porto é descontado do produtor. Caminhões parados por dias em filas para descarregar, rodovias esburacadas e estradas provisórias são gastos para os produtores, que têm suas rentabilidades impactadas.

“À medida que você tiver mais ferrovias, hidrovias trabalhando o ano inteiro, boas rodovias, aí você consegue equacionar mais essa questão do logístico e melhorar a rentabilidade dos produtores”, diz Ferreira.

Armazenagem

Além de modais de transportes diversos, modernos e funcionais, os quais permitiriam um melhor escoamento da produção, ampliar a capacidade e/ou permitir aos produtores armazenarem seus produtos poderia aumentar também a rentabilidade dos mesmos.

“A armazenagem é muito importante, principalmente, a nível de produtor. Quando ele tem o produto na mão, guardado, seguro, vende pelo valor que quiser”, explica.

Atualmente, o Brasil tem capacidade de armazenar, aproximadamente, 65% da safra de grãos. De acordo com os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o País possuía 9.424 estabelecimentos de armazenagem ativos no final de 2024, 3,5% a mais do que no fim de 2023. O Rio Grande do Sul lidera em número de armazéns (2.444), enquanto o Mato Grosso concentra a maior capacidade estática (59,2 milhões de toneladas). A FAO recomenda que a capacidade de armazenagem de um país seja 20% superior à produção nacional.

As adversidades logísticas enfrentadas pelos produtores de soja no Brasil reflete um sistema de escoamento ainda dependente de infraestrutura deficiente, afetando diretamente a rentabilidade dos produtores. A falta de armazéns adequados, o precário estado das estradas e as limitações nos modais de transporte são obstáculos que comprometem a eficiência do setor e necessitam de um olhar especial, tendo em vista o papel do Brasil como um dos principais celeiros do mundo.