
Embora o agronegócio brasileiro seja um setor resiliente e que se adapta muito bem às adversidades, ele não está completamente blindado das turbulências externas. Em um mundo globalizado, onde o comércio agrícola depende de mercados internacionais, insumos importados e, sobretudo, da estabilidade cambial, eventos como o atual confronto entre Israel e Irã reverberam diretamente nas cadeias produtivas do campo.
Desencadeado no dia 13 deste mês, o conflito elevou as tensões geopolíticas no Oriente Médio e reacendeu a instabilidade nos mercados globais, impulsionando o preço do petróleo e ampliando a insegurança logística em rotas estratégicas.
Essa disparada nas cotações do petróleo tem consequências diretas para o setor de biocombustíveis; o impacto dentro do agro, porém, não para por aí. Os mercados de cereais e de fibras também devem ser impactados, bem como setor de fertilizantes.
Impactos da elevação nos preços do petróleo
Os contratos mais ativos do petróleo no mercado internacional, negociados em Nova York e Londres – WTI e Brent, respectivamente –, acumulam ganhos de mais de 20% no mês. Parte desse movimento reflete não apenas os riscos geopolíticos na região, mas também a importância estratégica do Irã na cadeia global de fornecimento de petróleo — sobretudo por sua posição geográfica no Estreito de Ormuz.
Localizado entre Omã e o Irã, o estreito liga o Golfo Pérsico ao norte com o Golfo de Omã e o Mar Arábico ao sul. Anualmente, passa pelo local cerca de 20% do consumo global de petróleo.
De acordo com análise da DATAGRO, esse movimento já fez com que o preço da gasolina praticado nas refinarias da Petrobras voltasse a ser negociado abaixo da paridade de importação, o que pode pressionar a estatal a rever sua política de preços. Isso impacta diretamente as cotações de fretes rodoviários e marítimos.
Paralelamente, a alta do petróleo pode gerar vantagens competitivas aos biocombustíveis, sobretudo ao etanol e ao biodiesel, o que mexe também com o mercado de açúcar e soja. “Ainda é cedo para desenhar algo, mas, com um etanol mais competitivo, as usinas podem rever seus esforços e redirecionar mais cana para a fabricação do combustível ao invés de açúcar, cenário contrário ao observado nos primeiros dois meses da safra 2025/26”, afirma a consultoria.
Preocupações no setor de fertilizantes
Envolvido diretamente no conflito, o Irã é um dos principais produtores globais de ureia, que representa cerca de 50% de todo nitrogênio aplicado nas lavouras brasileiras. Em 2024, o Brasil importou toda ureia utilizada no campo, sendo o país persa responsável por 17% desse fornecimento.
Uma escalada maior do conflito pode afetar a oferta global do produto e encarecer os preços no mercado internacional. “Apesar de ainda não haver evidências de desabastecimento, os intensos ataques e retaliações entre Israel e Irã já causam reações nos mercados de gás natural e ureia, com os contratos futuros desses produtos, produzidos e exportados por ambos os países envolvidos, registrando valorizações significativas”, aponta a DATAGRO.
Algodão e milho também em alerta
Da mesma maneira que a alta no preço do petróleo eleva a competitividade dos biocombustíveis, ela também aumenta as vantagens competitivas das fibras. Ou seja, caso haja um encarecimento das fibras sintéticas derivadas de petróleo, como a de poliéster, a pluma natural – algodão – passa a ser uma alternativa mais viável para a indústria.
Para o milho, a situação é um pouco mais prática e direta. Análise da DATAGRO Grãos, com base em dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), mostra que, atualmente, o Irã está entre os principais destinos das exportações brasileiras do cereal.
Ao longo de 2024, o país persa adquiriu 4,3 milhões de toneladas de milho do Brasil, o equivalente a cerca de 11% dos embarques brasileiros no ano. Este volume é superado apenas por aqueles enviados ao Egito, que recebeu 5,5 milhões de toneladas, e ao Vietnã, 4,7 milhões de toneladas.
No acumulado de 2025 até maio, as exportações brasileiras ao Irã somam 2,2 milhões de toneladas, correspondente a 36% das exportações brasileiras no período – liderando o quadro de destinações dos embarques, após crescimento de 152% frente às compras realizadas entre janeiro e maio de 2024.
“Consequentemente, eventuais retrações na demanda iraniana poderão repercutir negativamente sobre a pauta exportadora brasileira – em especial em ano de produção expressiva, que deve chegar 133 milhões de toneladas na safra 2024/25, com potencial exportador de 41 milhões de toneladas no ano comercial 2025/26”, mostra relatório da consultoria.
De acordo com a DATAGRO, a exportação dos excedentes de milho no Brasil é importante para limitar recuos muito expressivos dos preços domésticos, provendo equilíbrio ao mercado. “Interferência nesse total geraria estoques elevados e pressão aos preços domésticos”.