
A urgência climática pressiona todos os setores da economia a reverem seus impactos ambientais. No campo, cresce o interesse pela pecuária regenerativa — uma abordagem que promete não apenas produzir carne e leite de forma sustentável, mas também capturar carbono da atmosfera.
Assim como a agricultura regenerativa, o termo passou a circular com frequência entre especialistas em sustentabilidade e produtores rurais, sempre presente nas metas de grandes companhias do setor. Mas será que a ciência confirma esse potencial?
Neste artigo, vamos explorar os fundamentos do sequestro de carbono, os mecanismos da pecuária regenerativa e o que dizem os estudos científicos sobre o tema.
O que é sequestro de carbono?
O sequestro de carbono é um processo natural ou artificial no qual o dióxido de carbono (CO₂), principal gás responsável pelo efeito estufa, é removido da atmosfera e armazenado em reservatórios como solos, florestas e oceanos. Na natureza, esse processo ocorre principalmente por meio da fotossíntese, quando as plantas capturam o CO₂ atmosférico e o armazenam em suas estruturas e no solo.
Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), para evitar um aumento global de temperatura acima de 1,5°C, será essencial não apenas reduzir as emissões de carbono, mas também capturar e armazenar grandes volumes de CO₂. Nesse contexto, práticas agrícolas e pecuárias com potencial de capturar carbono têm atraído a atenção de cientistas e do setor agropecuário.
Como a pecuária pode regenerar o solo?
A pecuária regenerativa é um conjunto de práticas que buscam restaurar a saúde do solo, aumentar a biodiversidade e promover o bem-estar animal, mantendo a viabilidade econômica da produção. Ao contrário da pecuária convencional, que muitas vezes resulta em degradação do solo e perda de matéria orgânica, a pecuária regenerativa busca integrar o rebanho ao ecossistema de forma inteligente, usando os animais como ferramentas de regeneração.
Um dos pilares dessa abordagem é o pastejo rotacionado intensivo, também conhecido como manejo holístico, com uma agricultura de baixo carbono. Nele, o gado é deslocado com frequência entre piquetes, imitando o comportamento de manadas em ambientes naturais. Isso permite que o solo se recupere entre as ocupações e que a vegetação cresça com mais vigor, o que contribui para a formação de matéria orgânica e, consequentemente, para o armazenamento de carbono no solo.
Além disso, há evidências de que solos com cobertura vegetal contínua apresentam maior capacidade de reter carbono, água e nutrientes, o que reduz a necessidade de fertilizantes sintéticos e melhora a resiliência do sistema produtivo.
Quais práticas favorecem o sequestro de carbono no campo?
Inúmeras práticas agrícolas e pecuárias vêm sendo testadas e implementadas para potencializar o sequestro de carbono no solo. A seguir, destacamos algumas que têm mostrado bons resultados:
1. Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF)
O sistema ILPF combina o cultivo agrícola, a pecuária e a silvicultura em uma mesma área, promovendo maior eficiência no uso da terra. As propriedades que adotam a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta apresentam maior densidade de carbono no solo em comparação com sistemas convencionais.
2. Pastejo rotacionado
Essa técnica evita o sobrepastejo e promove a regeneração das pastagens. Com o solo protegido por vegetação e raízes ativas, há aumento da infiltração de água e formação de agregados no solo, favorecendo o acúmulo de matéria orgânica.
3. Plantio direto
No plantio direto, o solo não é revolvido, o que reduz a oxidação da matéria orgânica e permite maior acúmulo de carbono. Essa prática também é aliada do controle da erosão e da melhoria da estrutura do solo.
4. Adubação orgânica e compostagem
O uso de composto orgânico e esterco melhora a fertilidade do solo e estimula a vida microbiana, fundamental para o ciclo do carbono.
5. Cobertura vegetal permanente
Manter o solo coberto com plantas vivas ou palhadas também reduz a temperatura do solo, aumenta a retenção de umidade e favorece o sequestro de carbono.
Afinal, é mito ou realidade? O que dizem os estudos?
A ideia de que a pecuária contribui com o meio ambiente ainda pode causar surpresa em quem não é do setor. Mas é exatamente essa a proposta da pecuária regenerativa: transformar o rebanho em aliado na regeneração do solo e no sequestro de carbono, ajudando a reduzir os impactos das mudanças climáticas.
Será que essa promessa se sustenta na prática? A ciência diz que sim — mas com algumas ressalvas.
Ciência confirma o potencial do sequestro de carbono
Estudos recentes mostram que sistemas bem manejados, como o pastejo rotacionado, a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) e o uso de cobertura vegetal permanente, podem aumentar significativamente os níveis de carbono armazenado no solo.
No Brasil, a Embrapa tem demonstrado, com base em resultados de campo, que sistemas de ILPF podem aumentar os estoques de carbono no solo em até 1,5 tonelada por hectare por ano, especialmente em regiões como o Cerrado.
Esses ganhos estão diretamente ligados à presença de árvores, à ciclagem de nutrientes e à recuperação de pastagens degradadas — fatores que promovem a formação de matéria orgânica no solo e ajudam a capturar carbono da atmosfera.
Apesar dos resultados promissores, os pesquisadores apontam que o sequestro de carbono tem limites temporais e físicos. O solo não acumula carbono infinitamente. Após duas ou três décadas, os estoques tendem a se estabilizar, atingindo o chamado ponto de saturação.
Outro ponto importante é que, mesmo com boas práticas, a pecuária continuará emitindo metano (CH₄), um gás de efeito estufa gerado pela digestão dos ruminantes. Ou seja, o sequestro de carbono pode reduzir a pegada ambiental, mas não a elimina completamente.
Além disso, o sucesso dessas práticas depende de fatores estruturais, como:
- Assistência técnica contínua;
- Investimento em infraestrutura e capacitação;
- Acesso a crédito e políticas públicas de incentivo.
Ou seja, o sequestro de carbono é uma realidade técnica, mas sua efetividade depende da adoção em larga escala e do suporte aos produtores.
Dessa maneira, a pecuária regenerativa pode sim sequestrar carbono, desde que adotada com planejamento, manejo correto e acompanhamento técnico. As ações em busca de uma pecuária regenerativa são ferramentas capazes de recuperar solos, aumentar a produtividade e ajudar na transição para uma agropecuária mais sustentável.
Entretanto, para que a transição aconteça em larga escala no Brasil, é necessário articular o conhecimento técnico com políticas públicas, incentivos de mercado e o protagonismo dos produtores. Com a difusão dos conhecimentos e adoção das medidas ideais, a pecuária brasileira pode representar um papel importante na sustentabilidade.
Com o Broto, você está sempre bem informado e por dentro das melhores novidades do mercado pecuário. Confira como a avicultura brasileira vive momento estratégico e quais são os próximos passos para aproveitar um momento promissor.