A cientista brasileira Mariangela Hungria, pesquisadora da Embrapa Soja, é a vencedora do World Food Prize 2025, considerado o Nobel da Agricultura, em reconhecimento à sua trajetória de mais de 40 anos dedicada ao avanço da microbiologia do solo. Sua principal contribuição foi o desenvolvimento de tecnologias que substituem total ou parcialmente os fertilizantes químicos por microrganismos benéficos ao solo, especialmente por meio da técnica de fixação biológica de nitrogênio (FBN).
Antes de encarar seu novo desafio científico, Mariangela será homenageada oficialmente no dia 23 de outubro, em Des Moines, Iowa (EUA), durante a cerimônia de entrega do prêmio.
Bioinsumos e fertilizantes naturais: a revolução no campo
Em entrevista concedida ao Broto Notícias durante o 10º Congresso Brasileiro da Soja, realizado em Campinas (SP), Mariangela explicou os impactos de sua pesquisa para o agronegócio brasileiro. O foco de seu trabalho está no uso de bactérias do solo capazes de fixar o nitrogênio atmosférico, tornando-o disponível para as plantas. Essas bactérias funcionam como bioinsumos inoculantes, promovendo o crescimento das culturas e reduzindo drasticamente a necessidade de fertilizantes sintéticos.
A técnica permite que produtores rurais cultivem leguminosas, como a soja, sem a necessidade de aplicar 400 ou 500 quilos de adubo nitrogenado por hectare. Em vez disso, basta inocular a semente com microrganismos que realizam a fixação do nitrogênio, promovendo uma agricultura mais eficiente, econômica e sustentável.
“É um risco muito grande o Brasil depender de maneira tão alta, cerca de 85% de tudo que utiliza, da importação de fertilizantes. A FBN fez o agro brasileiro economizar cerca de US$ 26,7 bilhões com a não importação de adubos nitrogenados. Não seríamos líderes na produção de soja se não fosse esta técnica, que é utilizada por mais de 80% dos sojicultores no país. Então, o desenvolvimento de novos bionsumos neste segmento é crucial para diminuirmos este percentual de importação”, assinala Mariangela, que acrescenta: “e pesquisas já mostram que os resultados que foram obtidos com a soja podem ser estendidos a outras culturas, como milho, arroz e também para as pastagens”.
Microrganismos aliados da produtividade agrícola
Os microrganismos benéficos ao solo, como as bactérias que fixam nitrogênio, também auxiliam na síntese de fitormônios, na solubilização de fosfatos e de rochas potássicas, contribuindo diretamente para o aumento da produtividade. Essa abordagem inovadora vem sendo considerada essencial para reduzir o uso de fertilizantes químicos e para ampliar a sustentabilidade da agricultura brasileira.
Segundo a cientista da Embrapa, os bons resultados obtidos com a soja já podem ser aplicados a outras culturas, como milho, arroz e pastagens — ampliando ainda mais o impacto da FBN no agronegócio.
O novo desafio: proteger os microrganismos do calor extremo
Após transformar a relação entre a agricultura e os fertilizantes, o novo desafio de Mariangela Hungria é enfrentar os efeitos das mudanças climáticas no campo. O foco agora está em proteger os microrganismos do solo das altas temperaturas, que têm se tornado mais frequentes em regiões agrícolas como o Matopiba.
“É um problema e tanto. Na região do Matopiba, temos dados que mostram temperaturas do solo acima de 50ºC. Então, queremos avançar em como desenvolver tecnologias que façam com que estes microrganismos consigam ‘trabalhar’ nestas condições inóspitas”, adianta.
“Um dos caminhos pode ser a pesquisa de novos bioinsumos com características de proteção solar”, conclui Mariangela.