
Resumo da notícia
- Com previsões de safras recordes de soja e milho em 2025/26, cresce a necessidade de modernizar a comercialização frente ao volume e às oscilações dos mercados globais.
- A busca por agilidade e segurança impulsiona o uso de tecnologia, conectividade e dados em tempo real para decisões de preço e venda.
- Nessa linha, a Grão Direto automatiza preços e conecta produtores e compradores, enquanto a Justoken transforma produção em ativos digitais rastreáveis via blockchain.
- A tokenização permite ao produtor trocar sua produção futura por insumos e crédito com mais liquidez e transparência, modernizando o barter tradicional.
- Embora a conectividade ainda seja desigual, o setor avança rumo a blockchain, IA e contratos inteligentes, consolidando a comercialização digital como prática cotidiana.
O agronegócio brasileiro vive um momento de profunda transformação. À medida que o país consolida sua posição como um dos maiores exportadores globais de soja, milho e carnes do mundo, cresce também a necessidade de modernizar os processos de comercialização e tornar o fluxo de negócios mais ágil, seguro e transparente.
Segundo a consultoria DATAGRO, o Brasil deve colher 183 milhões de toneladas de soja e 142 milhões de toneladas de milho na safra 2025/26 – dois cultivos que, ao lado da pecuária, formam a espinha dorsal da agropecuária nacional. No caso da oleaginosa, 62 milhões de toneladas devem ser destinadas ao processamento para produção de farelo e óleo, enquanto 112 milhões seguirão para exportação. Já no milho, a maior parte – 97 milhões de toneladas – deverá atender à demanda interna, e outras 45 milhões de toneladas serão enviadas ao exterior.
O volume expressivo dessas commodities reforça a importância da eficiência comercial no campo. Mais do que nunca, a comercialização agrícola passa a depender da integração entre informação, conectividade e tecnologia, que possibilitam decisões mais rápidas e assertivas em um ambiente globalizado e sujeito a constantes oscilações cambiais e climáticas.
Comércio digital de commodities: um novo ciclo para o agro
Nesse cenário, agtechs como a Grão Direto e Justoken se destacam por propor modelos distintos – porém complementares – de digitalização da comercialização agropecuária.
Fundada em Uberaba (MG), a Grão Direto nasceu com o propósito de digitalizar a comercialização de grãos. Seu sistema conecta produtores e compradores em tempo real, automatizando a formação de preços a partir da Bolsa de Chicago (CME), câmbio, frete e impostos.
“O sistema faz cerca de 47 milhões de cálculos de preço por dia, permitindo que o vendedor veja o valor atualizado e feche o negócio diretamente pelo aplicativo, site ou até via WhatsApp”, explica Fred Marques, cofundador e diretor de tecnologia (CTO) da Grão Direto.
Já a Justoken se estrutura sobre outro eixo: a tokenização de ativos agrícolas. Segundo Eduardo Novillo Astrada, CEO da companhia, tokenizar significa transformar a produção (soja, milho, proteína animal) em um ativo digital lastreado, negociável e rastreável via blockchain. Como ele define, é “dar vida digital à produção agrícola”.
“Ao tokenizar, o produtor passa a ter um ativo digital com liquidez, que pode ser negociado instantaneamente, usado como garantia ou integrado a operações financeiras, com segurança e transparência”, explica Eduardo.
Barter digital: o novo formato da troca entre produção e investimento
Um dos avanços mais significativos na digitalização do agronegócio é a modernização do barter, sistema tradicional de troca em que o produtor adquire insumos e paga com parte da produção futura. Antes restrita a negociações presenciais e contratos físicos, essa modalidade ganhou agilidade e transparência com a chegada das plataformas digitais e da tecnologia blockchain.
Para a Justoken, o barter tradicional, ainda que uma ferramenta muito importante para o campo, tem as suas limitações, como a burocracia, falta de transparência e a distância entre o que é o custo real com o mercado financeiro. “A tokenização é o barter 4.0”, afirma Eduardo.
“O produtor pode representar sua produção futura em tokens para negociar insumos, captar financiamento ou antecipar receita. É um barter digital, eficiente e transparente, que abre novas possibilidades de crédito e liquidez para o produtor rural”, explica.
O campo cada vez mais conectado
De aplicativos de gestão rural a plataformas de negociação e tokenização, a transição digital no campo já é uma realidade. Segundo Marques, da Grão Direto, “o produtor rural brasileiro não tem medo de tecnologia; ele quer entender e ver o resultado”. A tendência é que, com a sucessão familiar e a ampliação do acesso à conectividade, o uso de soluções digitais se torne rotina.
O executivo ainda afirma que, no futuro próximo, a comercialização digital de grãos será tão natural quanto pedir um transporte por aplicativo. “Gosto de comparar com o início do Uber ou do iFood: no começo parecia arriscado, mas hoje é algo comum. O mesmo vai acontecer com a comercialização digital de grãos. Em pouco tempo, fechar negócios online será parte do dia a dia do produtor rural brasileiro”, conclui.
A percepção também é compartilhada por Eduardo, para quem o produtor rural brasileiro já opera em um ambiente amplamente digitalizado, impulsionado, sobretudo, pela popularização do PIX. Segundo ele, a adoção do sistema de pagamentos instantâneos “mudou a relação do produtor com o dinheiro e com o digital”, abrindo espaço para novas práticas de negociação e gestão financeira.
Ainda assim, Eduardo ressalta que o avanço não é uniforme em todo o território. Conectividade no campo e capacitação digital seguem como pontos de atenção – especialmente em regiões de baixa cobertura de internet ou menor acesso a suporte técnico. Mesmo assim, ele considera que o setor está pronto para a próxima etapa.
“O agro brasileiro já é digital e está preparado para dar o próximo passo”, reforça.
Esse próximo passo, diz o executivo, envolve a adoção de tecnologias que devem se tornar padrão operacional no agronegócio nos próximos anos: blockchain, inteligência artificial, contratos inteligentes e integrações financeiras automatizadas. Cada uma delas atua em uma camada diferente da cadeia produtiva: da rastreabilidade ao gerenciamento de riscos e à automação de contratos.